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EDUARDO LIMA Fotografia

1 de agosto de 2018

“De repente, não mais que de repente” a rede nos surpreende e alguém apanha por aí uma réstia de luz, algo que a história num descuido lampejou e lá está, em pleno Facebook, uma fotografia em preto e branco. Num banco de praça, destes de concreto, apertam-se Carlos Drummond de Andrade, Vinícius de Moraes, Manuel Bandeira, Mário Quintana e Paulo Mendes Campos. Não há crédito para o fotógrafo, o que o injustiça e é crime. Embora um registro com tal conteúdo tenha por si o condão de suplantar a oportunidade de uma fotografia. É um acaso, um presente. Por mim fui viajar no instantâneo e deu-me de ouvir a pequena voz de Drummond: “tenho apenas duas mãos e o sentimento do mundo, mas estou cheio de escravos, minhas lembranças escorrem e o corpo transige na confluência do amor”. Vinícius não se fez de rogado e também soltou o verso: “para isso fomos feitos: para lembrar e ser lembrados, para chorar e fazer chorar, para enterrar os nossos mortos – por isso temos braços longos para os adeuses, mãos para colher o que foi dado, dedos para cavar a terra”. Segue-se um silêncio até Bandeira dizer: “a aurora apaga-se, e eu guardo as mais puras lágrimas da aurora. O dia vem e, dia adentro, continuo a possuir o segredo grande da noite. Belo, belo, belo, tenho tudo quanto quero”. O clima era de enlevo e todos eles, poetas maiúsculos, juntaram-se na foto histórica para nos provocar e à curiosidade dos mosquitinhos que voam ao redor das plantas e beijam gotas d’água. Imaginemos, de novo, por favor, Drummond, Vinícius, Bandeira, Quintana e Paulo Mendes conversando num banquinho de praça! Imaginemos que falassem de céu, ou de inferno, falassem de crianças, jardins, harmonia ou guerra. Do que falassem o tema viria numa cama de jasmins e borboletas, precedidas – todas as palavras – de benção e de suspiros. Que mágica. Quintana até então calado resolve se deixar ver: “um outro mundo existe…uma outra vida.. Mas de que serve ires para lá? Bem como aqui, tu’alma atônita e perdida nada compreenderá!”. E nada mais disse. Esperou-se por Paulo. E o Mendes Campos tímido, quase a se esconder da vida: “onde a palavra começa, a palavra acaba e aí está Deus. Para Deus, todos os homens levam nos bolsos objetos escondidos: selos antigos, uma esfera de aço, um anzol enferrujado, um canivete sem folha; por isso é preciso, de pena de nós mesmos, fazer força para não chorar. Pois todo menino enterra seu tesouro”.  Meu Deus, eu disse diante da foto no banquinho da Praça. Não sei quem fez a foto, mas queria abraçá-lo e pedir-lhe luz. Contudo, acabei por ver – só eu? – um brilho acima dos poetas. Intenso, vindo da nuvem, E nela um anjo, não “destes tortos que vivem nas trevas”, mas um anjo profilático de unhas feitas tocando harpa. E no rosto branquinho dele escorrendo uma lágrima. Senão de emoção, de aleluia, talvez de saudade. Embora seja mais provável a um anjo encontrar-se, vez em quando, com Vinícius, Carlos, Paulo, Mário e Manuel. Devem todos morar lá pelas bandas do céu.

 

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